Bordon: “O Rogério conseguiu dar vida novamente ao São Paulo” – Entrevista AT

Aos 46 anos de idade e com uma vida dedicada ao futebol, hoje Marcelo Bordon, natural de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, local de onde atendeu ao Arquibancada Tricolor, durante uma daquelas fortes chuvas das águas de março que fecham o verão, é um bom exemplo de ex-jogador que soube conduzir a vida após a despedida dos gramados, talvez fruto do que pôde aprender em mais de 11 temporadas atuando no futebol alemão.

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Um time que voltou a ter vidaZagueiro que valeria milhões hojeConfira na integra a entrevista exclusiva do Bordon ao Arquibancada TricolorAT: Bordon, quando você chegou ao São Paulo?AT: Você fez parte do expressinho, time formado por jovens, que atuava quando o profissional tinha outros compromissos. Essa equipe foi campeã da Copa CONMEBOL em 1994, tinha você, Rogério Ceni, enfim. Time comandado pelo Muricy, mas com a supervisão do Mestre Telê. Como foi aquele período?AT: Em cima disso que você disse em relação à cultura do São Paulo: Hoje vemos no São Paulo, o Rogério Ceni recuperando um cara que é da sua posição, o Diego Costa, que a torcida pegava no pé, e que não teve muitas oportunidades com treinadores que passaram recentemente por lá. Legal um garoto que veio da base, poder se recuperar dentro do próprio clube.AT: Indo nesse embalo do momento do São Paulo. Em sua opinião, nessa final do Campeonato Paulista entre São Paulo e Palmeiras, quais as chances do Tricolor frente ao favorito Palmeiras?AT: No São Paulo você atuou em 238 partidas: 106 vitórias, 70 empates e 62 derrotas, e balançou as redes oito vezes. Talvez o gol mais bonito tenha sido contra o Corinthians, 2 x 2 Campeonato Paulista de 1995?AT: A sua passagem pelo futebol alemão foi ótima, lá você é ídolo do Stuttgart e Schalke 04. Na seleção brasileira você não teve tantas chances, atuou em um jogo apenas. Faltou um pouco mais de oportunidades com a camisa do Brasil?AT: E você não aceitou porquê?AT: Vamos falar de um fato engraçado. Em 2019 o São Paulo realizou no Morumbi o Legends Cup, você participou com o Muricy Ramalho. E tem um momento que ele fica irritado com você, solta um monte de palavrões, porque estava reclamando de uma dor no nariz. Ele sempre foi assim?

Empresário renomado em diversas atividades, o ex-atleta até tentou a carreira de treinador. Em 2015 assumiu o Rio Branco de Americana, mas desistiu rapidamente devido a dura realidade de quem não faz parte da elite do futebol brasileiro.

Um time que voltou a ter vida

De fora, analisa um feito que talvez nem todo torcedor consiga enxergar: para Bordon, o ex-companheiro e atual treinador do São Paulo, Rogério Ceni, é o grande responsável pela sinergia que deu liga nessa reta final de Campeonato Paulista entre time e torcida, alcance esse que vai além do possível título estadual.

Em relação à grande final do Paulistão em que o São Paulo venceu o primeiro jogo por 3 x 1, e agora decide o título no Allianz Parque, Bordon entende que a regularidade do Palmeiras precisa sim ser levada em conta, até pelo que o time vem conquistando nos últimos tempos. Mesmo assim, pela experiência que tem no futebol e com algumas finais no currículo, considera o São Paulo mais no clima de uma grande final.

Zagueiro que valeria milhões hoje

Como gosta de dizer o apresentador Milton Neves, quando jogador, Bordon era do estilo espadaúdo, zagueiro forte, 1,94m, altura que os filhos Felipe e Ricardo, que atuam nas divisões de base da Ferroviária, e que despertam interesse dos finalistas em questão, herdaram.

Ao questionado, o ex-zagueiro diz que seu estilo hoje valeria milhões, velocidade, marcação forte de um tempo que os zagueiros, segundo ele, eram zagueiros de verdade. Como ídolo do Stuttgart e Schalke 04, além do respeito dos torcedores germânicos, a frustração de não ter defendido a seleção alemã é evidente, o convite foi aceito, mas em meio ao processo de naturalização, 40 minutos com a camisa da seleção brasileira em um amistoso foram suficientes para findar o desejo, depois disso não foi mais convocado, situação que até hoje ele indaga. No São Paulo apareceu após se destacar em uma excursão do Botafogo de Ribeirão Preto à Itália, Bordon foi um dos símbolos do “Expressinho”, equipe comandada pelo iniciante treinador Muricy Ramalho, sob a batuta do mestre Telê Santana.

Confira na integra a entrevista exclusiva do Bordon ao Arquibancada Tricolor

AT: Bordon, quando você chegou ao São Paulo?

Bordon: A minha aparição no São Paulo foi em dezembro de 96, no finalzinho do ano para disputar a taça São Paulo. Eu fazia a base no Botafogo de Ribeirão Preto, foi quando o Botafogo foi fazer uma viagem para a Itália, eu sendo o quinto zagueiro. Tinha 16 anos, machucaram dois zagueiros e eu joguei as seis partidas, e um empresário quis me comprar lá. Fui correto com o Botafogo e o presidente chamado Laerte Alves, na época era conselheiro do São Paulo, e ele viu a nossa decisão correta e falou: “disputa o seletivo seis meses, e depois vou te mandar para o São Paulo”. Esse foi o primeiro contato. 

Bordon SPFC | Arquibancada Tricolor
Bordon no São Paulo, em 1997
AT: Você fez parte do expressinho, time formado por jovens, que atuava quando o profissional tinha outros compromissos. Essa equipe foi campeã da Copa CONMEBOL em 1994, tinha você, Rogério Ceni, enfim. Time comandado pelo Muricy, mas com a supervisão do Mestre Telê. Como foi aquele período?

Bordon: Na verdade a gente sempre teve o Muricy na nossa frente, e eu nunca joguei em um time tão bom, igual o expressinho, fomos campeões da Conmebol. Os jogadores do São Paulo, do primeiro time tinham tanta qualidade que era muito difícil para você passar para o primeiro time, por isso que ficou na nossa dependência, trazer esse time para cima, de treinar de competir, só que se tivesse algum atleta em baixa e o Telê Santana precisasse aí a gente subia. Só que eu nunca joguei em um time tão bom que dava raiva no time de cima, de tão bom que era. E o São Paulo já tem essa cultura, já vem com essa cultura dos meninos realmente incomodarem quem está em cima, e isso é muito bom. O time foi se encaixando, tinha aquela perspectiva de garotos novos chegarem ao profissional, como eu, Denílson na época, e fez essa mistura de experiência com os meninos e deu no que deu. Nós ganhamos na final de 6 x 1 no Peñarol (URU), que era o time da seleção uruguaia, e a gente fez um show no Morumbi, que ficou marcado pra sempre (o jogo da volta no Uruguai foi 3 x 0 para os donos da casa).

AT: Em cima disso que você disse em relação à cultura do São Paulo: Hoje vemos no São Paulo, o Rogério Ceni recuperando um cara que é da sua posição, o Diego Costa, que a torcida pegava no pé, e que não teve muitas oportunidades com treinadores que passaram recentemente por lá. Legal um garoto que veio da base, poder se recuperar dentro do próprio clube.

Bordon: O Rogério conseguiu dar vida novamente ao São Paulo, porque o São Paulo vem sofrendo, não é jogando mal, jogando bem, jogador bom ou não, faltava alegria, faltava aquele Morumbi cheio, faltava uma vitória boa, faltava confiança, e o Rogério conseguiu trazer isso de volta. Eu sei que deve ter sido muito difícil para ele, para o Muricy, imagino o desgaste que esses caras tiveram, mas como eles foram jogadores, eles sabem as dependências que a gente tem, sabe o que precisa, a confiança que precisa ser passada, e eles sabem o jogador que tem qualidade ou não. E as vezes é colocado em um momento difícil, as vezes não foi bem preparado para iniciar uma carreira no profissional, e no momento não tão agradável, o Rogério sabe o que está fazendo, ele tem essa sensibilidade de jogador, e agora estando do outro lado fica mais fácil pra ele.

AT: Indo nesse embalo do momento do São Paulo. Em sua opinião, nessa final do Campeonato Paulista entre São Paulo e Palmeiras, quais as chances do Tricolor frente ao favorito Palmeiras?

Bordon: Eu creio que o momento do São Paulo, como eu já disse, é de alegria, é de renovação, de confiança, é de jogar mesmo na expectativa. O Palmeiras está um pouco mais calejado, já disputou várias decisões, que deixa o time mais cascudo, preparado, mais calmo, mas um jogo de final não tem esse negócio, muito difícil você falar quem vai ser campeão, quem tem mais possibilidade. De um lado o Palmeiras, que joga um futebol não tão alegre igual o São Paulo, mas que joga para ganhar, consciência para ganhar, retrancado, no contra-ataque, o São Paulo vem dessa alegria, dessa molecada voando baixo. E assim, final já disputei algumas, e é sempre uma novidade, a gente fala: Ah! O Palmeiras é melhor, toma um gol logo no começo, igual foi aquele clássico contra o Corinthians, e muda toda a história, a tática, o Palmeiras tem que sair. O São Paulo tem que continuar fazendo, seguindo esse caminho que o Rogerio traçou, porque tem total condições de sair com o título.

AT: No São Paulo você atuou em 238 partidas: 106 vitórias, 70 empates e 62 derrotas, e balançou as redes oito vezes. Talvez o gol mais bonito tenha sido contra o Corinthians, 2 x 2 Campeonato Paulista de 1995?

Bordon: Pode ser! Do meio da rua né? No Ronaldo Giovanelli. Eu estava vendo alguns gols, é difícil eu fazer, mas quando eu fazia, era gol bonito (risos). É um dos gols mais bonitos que eu fiz.

AT: A sua passagem pelo futebol alemão foi ótima, lá você é ídolo do Stuttgart e Schalke 04. Na seleção brasileira você não teve tantas chances, atuou em um jogo apenas. Faltou um pouco mais de oportunidades com a camisa do Brasil?

Bordon: Eu creio que não, os jogadores que estavam na época, seleção brasileira, tinha total condições de jogar no meu lugar, não muda muito, a zaga não muda muito. Mas eles já estavam acostumados, talvez porque jogavam em time grande, e isso faz diferença, jogadores que atuavam no Bayern de Munique, Bayer Leverkusen, ou Roma, Milan, passa a ter uma visibilidade maior, e se for igual no futebol, acaba que que isso é uma regra natural das coisas. Eu poderia ter feito diferente, jogado na seleção alemã, que eu fui chamado para jogar e não fui.

Bordon Sttutgart | Arquibancada Tricolor
Atuando pelo Stuttgart, na Alemanha
AT: E você não aceitou porquê?

Bordon: Acho que pouca gente sabe, mas eu tinha aceitado sim! Porque eu fui em algumas convocações para a seleção e eu nunca joguei, então eles me chamaram em 2003 e 2004, e depois que eu aceitei o convite deles, eu fui convocado para a seleção para jogar na Hungria, e eu joguei meia-hora e me tirou totalmente a possibilidade de jogar em qualquer outro país. Isso foi uma “super” coincidência, né? Foi uma coisa muito estranha que aconteceu, e não falo de tristeza, nem alegria, mas era uma oportunidade que escapou, não sei se foi uma estratégia do Brasil, mas foi assim que aconteceu. Na Alemanha eu me tornei praticamente um alemão, agradeço aquele país até hoje, porque é incrível a aceitação que eles tiveram comigo naquele lugar, e até hoje nem entendo muito o tanto que somos grudados.

AT: Vamos falar de um fato engraçado. Em 2019 o São Paulo realizou no Morumbi o Legends Cup, você participou com o Muricy Ramalho. E tem um momento que ele fica irritado com você, solta um monte de palavrões, porque estava reclamando de uma dor no nariz. Ele sempre foi assim?

Bordon: O Muricy gosta de uma graça né, velho? (risos). Aquilo virou meme para todos os lados, acho que me mandaram umas 250 mil vezes aquele vídeo. Tá louco pô! Quando a gente veste a camisa do São Paulo, a gente passa pelo São Paulo e a gente se identifica com o São Paulo, eu sai com 21 anos, já tinha sido campeão, parecia que eu era mais velho, cheguei muito cedo no São Paulo. Então a gente passa a gostar e amar o clube, e quando eu voltei para jogar o Legends Cup, eu nem tinha muito porque estar ali, porque não sou uma legenda do São Paulo, eram os campeões mundiais, e eu fui porque tinha muito time alemão na parada, e aí eu falei eu vou porque conheço todo mundo, foi bem legal esse convite do São Paulo. E acabou que começamos a jogar como se tivesse na Copa do Mundo, foi uma brincadeira que começou a ficar sério, e aí a gente não queria perder mais, e nessas horas você se machuca, ficando velho acaba se machucando (risos). Ai ele (Muricy Ramalho), faz o show. Encontrei com ele na praia depois, ele falou: Quebrou o nariz? Não, quebrei o cabelo, pelo amor de Deus. E até hoje não tive a chance de consertar.

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