Lembranças de um torcedor que estava no Morumbi na final da Libertadores de 1992

Muito bom relembrar tudo que aconteceu naquele dia 17 de junho de 1992, há 28 anos. Com certeza, uma das datas mais importantes da história do São Paulo Futebol Clube. O dia que conquistamos, em casa, nossa primeira taça Libertadores da América, coisa que alguns times considerados “grandes” só conseguiram anos depois.

Nasci em 1974, em 1992 estava com 18 anos. Fui em todos os jogos da Libertadores de 1992 e, logicamente, não poderia faltar na decisão.
Fila gigante na antiga sede da Federação Paulista de Futebol, na Avenida Brigadeiro Luis Antônio. Sim, precisava ir lá para comprar os ingressos. Cheguei de manhã e só consegui comprar meu ingresso no final da tarde, depois de muito sol na cabeça, tumulto na fila que dava voltas nas ruas próximas.

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Canhoto do ingresso de geral

Em 1991, no título paulista conquistado em cima do time da marginal, consegui invadir o gramado. Muita gente do anel inferior acabou invadindo e resolvi ir junto. O policial até tentou me pegar pelo braço, mas não conseguiu, aí em seguida desistiu e alguns milhares de são paulinos invadiram e comemoram aquele título.

Fiquei com isso na cabeça e todos já falavam que se o São Paulo conquistasse o título contra o Newell’s Old Boys haveria uma invasão gigante no gramado. Por isso que pra essa final comprei geral, que ficava no piso térreo do Morumbi. Onde hoje fica o camarote Stadium. Abertura dos portões às 18h, fui um dos primeiros a entrar no estádio pra garantir meu lugar.

Fui acompanhando, por horas, o Morumbi se enchendo de uma forma que nunca tinha visto. O estádio balançava, o torcedor de hoje não consegue nem imaginar o que são mais de 100 mil pessoas pulando ao mesmo tempo, cantando, vibrando. Quase o dobro de pessoas que a lotação máxima atual do Morumbi permite. Pra se ter uma ideia, onde senta UMA pessoa hoje sentavam DUAS coladas e apertadas, lado a lado. Era bem desconfortável, mas a beleza do estádio e energia da torcida faziam com que tudo fosse recompensado.

Na época não existia celular, ou só pessoas muito ricas tinham, então nos dias seguintes, fui sabendo através de amigos que muita gente sem ingresso do lado de fora acabou invadindo, forçando portões, quebrando catracas, empurra empurra, tumulto. Ou seja, muita gente entrou sem pagar ingresso em diversos setores do estádio. Foi anunciado o público pagante de 105 mil pessoas, mas com certeza tinham aproximadamente 130 a 140 mil torcedores. Nunca tinha visto o Morumbi daquele jeito, e já tinha participado de muitas finais, desde o começo dos anos 80.

Quando começa o jogo uma partida muita tensa, difícil, havíamos perdido na Argentina e o 1×0 nos levaria aos pênaltis. Metemos bola na trave, tivemos várias chances, mas só conseguimos fazer o gol num pênalti em cima do talismã Macedo, que havia acabado de entrar. Raí bateu com categoria e fez o tão aguardado e esperado 1×0!

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Camisa autografada durante a Libertadores, ia a todos os treinos do CT da Barra Funda aos sábados. Treino aberto ao público

A partida acaba ficando nesse resultado mesmo e fomos aos pênaltis.
A tensão que eu estava no momento não consigo nem descrever. Era algo terrível porque sabíamos que aquele título seria um divisor de águas na história do São Paulo. Poderíamos disputar nosso primeiro mundial, Telê Santana poderia ter uma nova chance de conquistar o mundo.

Como não podia deixar de ser, a decisão de pênaltis foi muito tensa! Mas com uma linda defesa do nosso paredão Zetti, o Morumbi explodiu de uma forma nunca antes vista. Eu ali da geral, na hora da defesa, já pulei os 2 metros e pouco da geral para o poço ao lado do gramado, na queda perdi meus óculos e quebrei meu “inseparável” radinho de pilha que ia comigo em todas partidas do Tricolor.

Saí correndo para me juntar aos demais torcedores que também invadiam naquele momento. Todos chorando, se abraçando, alguns ajoelhados, só quem viveu esse momento mágico pode descrever como era pisar no palco sagrado minutos depois do São Paulo conquistar seu, até então, título mais importante da história!

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Visão do gramado todo invadido por mais de 10 mil torcedores, eu estava aí no meio

Correndo de um lado pro outro do gramado, chorando, pulando e cantando, vi que alguns torcedores estavam levando “lembranças” daquela partida. Com isqueiros cortavam pedaços da rede da trave onde foram as cobranças decisivas.

Cada um levava um pedaço, um torcedor ia cortando com o fogo do isqueiro, e até hoje tenho um pedaço dessa rede, conforme foto abaixo. Cheguei a pegar um pouco de grama e coloquei nos bolsos da bermuda, depois chegando em casa guardei em um pote e mantive por muitos anos.

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Pedaços da rede da trave onde foram as cobranças de pênaltis
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Pedaços da rede da trave onde foram as cobranças de pênaltis

Na comemoração, dentro do gramado, acabei encontrando um amigo que também havia invadido. Ficamos comemorando e só fomos embora umas 2 horas depois, quando a polícia militar começou a tirar todos os torcedores que ainda restavam.

Pude ver de perto a entrega da taça, a volta olímpica, os diversos ídolos de perto, emoção pura que guardo desse dia!

Acabei voltando de carona com esse meu amigo que encontrei no gramado, por volta de 3h da manhã. Chegando em casa nem dormi aguardando a banca de jornal abrir para comprar os pôsteres e jornais do dia.
Uma pena não ter máquina fotográfica na época. Era algo caro e pouca gente tinha. Senão teria fotos fantásticas pra exibir aqui. Mas é possível achar muito material profissional na internet, desse dia inesquecível.

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Faixa de campeão que comprei na saída do estádio, já de madrugada, após o título

Lembro de manhã minha mãe perguntando o que tinha acontecido com meus óculos, falei que perdi na hora de invadir o gramado. Aí ela falou, – vou ligar lá no Morumbi pra ver se acharam. Ligou e a atendente do Morumbi disse que sim, tinham achado 50 óculos perdidos, só naquela noite, e o meu deveria estar no meio. Rs. Que noite foi aquela!!! Que noite!!!

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Pôster da revista Placar, que comprei na manhã seguinte a conquista

Por Fábio Borges

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