O São Paulo e um novo “Morumbi”

Foto: Rubens Chiri e Paulo Pinto / saopaulofc.net

No programa Semana Tricolor do dia 16 de janeiro, uma declaração que fiz sobre o Estádio do Morumbi gerou alguns comentários positivos e negativos, pois há anos defendo a ideia que o São Paulo precisava de uma nova casa.

Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que NADA do que vou escrever aqui, deve acontecer. O Morumbi é tombado, o São Paulo não tem condição financeira nenhuma para projetos como esse, e há outros focos mais importantes hoje, como sanar dívidas, reestruturar o clube internamente para a profissionalização, por exemplo.

Isto posto, gostaria de debater aqui o que EU FARIA, se fosse possível. Acho que o São Paulo perdeu o “timing” pra pensar nisso e olha que o clube já recebeu propostas interessantes, mas não quis discutir.

Por que um novo estádio?

O Morumbi é um estádio que hoje ainda oferece uma boa experiência aos amantes do futebol, comporta shows e algumas iniciativas comerciais em sua estrutura. É, sem dúvidas, um ícone arquitetônico e tem muita história, portanto, é um tema delicado.

Frequento o estádio desde 1990/1991 e é um dos lugares que mais gosto, com lindas recordações e emoções que jamais vou esquecer por toda a minha vida. Quando falam que as arquibancadas ficam longe e não ajudam o time, inclusive discordo, pois o SPFC ganhou tudo o que ganhou, com a mesma arquitetura. O que faz um time ser campeão é ter boa gestão para comprar bons jogadores.

Porém, o futebol é um negócio. Por mais que muitas pessoas resistam e não aceitem, infelizmente, um clube de futebol sem grandes receitas, hoje não consegue competir por títulos. É um fato.

O Morumbi, especialmente após a metade da década de 2000, passou a ser mais rentável para o São Paulo, com a instalação de restaurantes, lojas, eventos, além dos shows. Muitos torceram o nariz, pois o estádio perdia capacidade de público. Mas era necessário também priorizar a segurança, e com o tempo, a rentabilidade caiu, pois ganhamos concorrência.

Para muitos, comportar muitas pessoas, é uma vaidade ou algo relevante. O Morumbi já comportou 150.000 pessoas quando construído e por várias vezes, teve jogos com mais de 100.000 pessoas, mas excluindo o romantismo, a experiência de quem viveu isso, não era tão boa. Você pode ver um pouco nesse vídeo.

Não por modismo ou motivado por rivais terem seus estádios novos, eu defendo a ideia de um novo estádio há anos. Acredito que da mesma forma que o São Paulo foi pioneiro em construir o maior estádio particular do planeta, na época, e de ser o primeiro clube a pensar em um Centro de Treinamento, deveria também ter sido pioneiro ao pensar em um novo Morumbi.

Reforma ou novo estádio?

Seria necessário um estudo muito mais profundo do que um simples artigo aqui, mas bons exemplos não faltam, tanto para quem optou por reformular seus estádios (casos do Internacional, River Plate, governos do Ceará, Rio de Janeiro e Minas Gerais), como quem reconstruiu ou construiu suas casas, como o Palmeiras, Grêmio, Atlético-MG e outros pelo mundo.

Se fosse possível, me parece que o projeto do Grêmio, inspirado no que fez o Ajax, em construir um novo estádio, em outro local, com uma parceria privada e entregando seu “antigo” estádio somente depois de tudo pronto, seria o meu modelo ideal.

Lembro que no caso dos gaúchos, boa parte da torcida foi contra, reclamou, e alguns ainda reclamam do bairro e entorno. Chegaram a dizer que a nova casa era “amaldiçoada” e o Grêmio nunca seria campeão lá. Seja crendice ou simplesmente ser contra sem ter argumentos, o fato é que o clube ganhou 5 regionais, 1 Copa do Brasil, 1 Recopa Sul-Americana, 1 Libertadores desde então, e tem um dos estádios mais modernos e rentáveis do mundo.

Há vários fatores para a construção de um novo estádio, como o tempo de vida da construção atual, alto custo de manutenção, baixo padrão de conforto, serviços de baixa qualidade, segurança deficiente, estacionamento praticamente inexistente e a região altamente habitada. Tem que ser considerados também os problemas em uma obra desse tamanho, como greves, paralisações, ações na justiça, alvarás e tudo o mais.

O espaço físico no entorno atual, impossibilita ou torna difícil e mais caro realizar obras mais profundas, como instalação de pilares de sustentação para uma cobertura, construção de um estacionamento subterrâneo devido às enchentes no local, rebaixamento do nível do gramado e aproximação das arquibancadas ao campo, devido ao córrego Antonico, que passa por baixo do gramado, como é possível ver nessa imagem:

morumbi corrego | Arquibancada Tricolor
Obras de aterramento do córrego Antonico no Estádio do Morumbi – anos 50

O que seria possível fazer?

Em setembro de 2022, a prefeitura e governo do estado prometeram uma obra de canalização do córrego para o fim das enchentes no local, mas até o momento, nada saiu do papel, mais uma vez. Todos os anos, a sede social do São Paulo FC sofre com alagamentos e grandes prejuízos.

Alagamento | Arquibancada Tricolor
Área das piscinas tomadas por lama, nos fundos da arquibancada do Estádio do Morumbi — Foto: Reprodução/TV Globo

Eu defendo a ideia de construção até mesmo em outro bairro, caso não fosse possível no mesmo local. Assim, com uma estrutura criada do zero, seria possível gerar um novo local com vida útil para muitos anos e até mesmo com melhores acessos de transporte coletivo e viários.

A cidade ainda tem áreas subutilizadas, degradadas ou desvalorizadas, que poderiam compor um projeto de revitalização e incentivos públicos com a chegada de uma praça de esportes que atrairia comércio, melhor segurança e até moradores.

No programa Semana Tricolor, citei como um exemplo, uma região entre o bairro do Ipiranga e Mooca, onde há muitos galpões e espaços, e um projeto de construção da futura Estação São Carlos, que integraria Metrô, CPTM e Expresso Tiradentes.

Uma venda do terreno atual onde está o Estádio do Morumbi, possibilitaria ao São Paulo, buscar um novo terreno, tal como fez quando vendeu o Canindé para comprar parte do atual Morumbi, ou como o Grêmio fez.

Um estádio novo em um local amplamente coberto por linhas de metrô, trem e ônibus, com espaço para construção de estacionamentos e chegada de empreendimentos comerciais e residenciais, não seria nada mal. Mas, como falei, tudo aqui é um exercício de imaginação.

Mais receitas e parceiros comerciais

Um novo espaço atrai torcedores, novos parceiros comerciais, novos eventos e possibilita a comercialização de novos formatos de utilização. O tal conceito de Arena Multiuso, que muitos usam pejorativamente dizendo que “Arena é pra boi”.

Logicamente, reforço aqui, que seria preciso criar um projeto muito bem estruturado, gerenciado de forma competente e séria, para evitar endividamentos e loucuras como o estádio do Corinthians, construído às pressas para a Copa do Mundo de 2014 e outras politicagens. O prejuízo fica para o clube e todos “pulam fora”.

Um estudo bem feito, permitiria ainda a manutenção de espaços populares para o torcedor, já que a tendência é que os clubes, cada vez mais, priorizem o acesso a Sócios-Torcedores, que ajudam a custear os gastos.

Quem é contra a ideia, se apega apenas aos exemplos ruins, mas é possível fazer algo assim acontecer e isso pode representar um divisor de águas na história de um clube, se bem executado.

Você pode discordar, por ser um rival, mas é inegável que o sucesso do Palmeiras, que estava em um caminho muito perigoso, próximo de uma falência até 2014 e acumula dez títulos após a inauguração do Allianz Parque, se deve – não somente a isso, claro – também à nova casa.

Allianz Parque | Arquibancada Tricolor
Allianz Parque, estádio do Palmeiras em dia de show

As principais produtoras de grandes shows, procuram o estádio do rival, grandes eventos corporativos acontecem por lá, companhias procuram camarotes para relacionamento e experiências com seus clientes em estádios novos. O Morumbi, hoje, ainda consegue competir, mas e daqui a 10 ou 15 anos?

Vale citar que o Morumbi “ganhou” os shows da banda Coldplay, apenas por um conflito de datas da produção com o estádio palmeirense. O Morumbi não foi a primeira opção.

Apuramos que em média, nos grandes shows, o São Paulo recebe em torno de R$ 1,5 milhão de aluguel por noite e um percentual no consumo de bebidas e alimentos durante os eventos. Recentemente houve shows do Metallica e Iron Maiden. Porém, outro ponto a se considerar: as “grandes bandas” que demandam público para shows desse porte, estão acabando ou encerrando atividades com o tempo.

Problemas atuais

As produtoras de eventos acabam preferindo fazer mais datas de shows em estádios com melhor logística e estrutura para a instalação e gestão dos equipamentos. As opções de retorno financeiro também aumentam com mais camarotes e espaços comerciais melhor estruturados.

Quem frequenta o Morumbi e circula pela dependências do estádio, vê áreas muito bem cuidadas, em comparação à idade do local, mas ao mesmo tempo, pode ver vários espaços vazios e inutilizados, assim como pontos cegos, banheiros ruins, acessos insuficientes para entrada e escoamento de pessoas, goteiras, “puxadinhos” e problemas.

Isso sem mencionar no entorno, onde você é extorquido por flanelinhas, muitas vezes precisa sair correndo antes do jogo terminar (quando começa às 21h45) para pegar o metrô aberto, já que a estação fica a 1.5km de distância e outros fatos. Aliás, a chegada do metrô na região, ajudou muito a aumentar a média de público, mas ainda existe esse problema que comentei acima.

Eu sei que não é legal ler ou ouvir isso sendo são-paulino, pois sempre tivemos muito orgulho da nossa casa, mas é preciso pensar à frente e o que se fazer. É preciso aceitar e enxergar os problemas para pensar em soluções.

E se fosse feita uma reforma?

Entendo que a construção de um novo estádio, seria uma utopia e o São Paulo perdeu o momento para pensar nisso. Portanto, seria possível usar os bons exemplos para pensar em uma reformulação do Morumbi.

O exemplo mais citado por todos que pensam nisso, é o do Estádio Monumental de Nuñez, do River Plate em Buenos Aires, que tem uma arquitetura e formato estrutural muito semelhante ao Morumbi.

Basicamente, o estádio teve o nível do gramado rebaixado, retirada da pista de atletismo e a construção de um novo lance de cadeiras que vão a uma distância mais próxima do gramado, aumentando a capacidade do estádio para 81 mil pessoas, tornando-o o maior da América do Sul.

Monumental de Nunez Foto River Plate | Arquibancada Tricolor
Estádio Monumental de Nuñez, do River Plate – Estrutura semelhante à do Morumbi e obras de modernização

Repito: aumento de capacidade não significa necessariamente mais receitas, até porque, por mais que existam jogos com lotação máxima em finais, a maior média de público do São Paulo na história, trouxe 33.709 torcedores em 2017.

As obras na casa do River Plate englobam mais do que o aumento da capacidade, mas novos camarotes (180), 926 stands de hospitalidade, restaurante 24 horas e circulação 360° em camarotes, três novos níveis de estacionamento e um novo Instituto River, entre outras importantes inovações, segundo o clube argentino.

É possível modernizar o Morumbi? Sim. E sem precisar deixá-lo como uma colcha de retalhos ou um lego com peças diferentes, montadas de forma improvisada. Tudo é questão de ter projetos sérios, bem estruturados e principalmente, bem executados e com gestão de crises.

Esse tema é longo e delicado. Eu poderia escrever muito mais pois é um assunto que me interessa bastante, embora eu não seja um profissional da área, mas queria deixar esse debate aqui para que vocês comentem suas opiniões.

Você pode discordar, o que acho que vai acontecer muito e quero ouvir suas opiniões! Diferente daquela meia dúzia que não tem argumento nenhum e o melhor que consegue fazer, é apenas xingar.

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*As opiniões expressas aqui são de responsabilidade do autor do texto, e não refletem a opinião do site

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