Roger: “O São Paulo começou a contratar goleiros sem história, sem currículo” – Entrevista AT

O status de um dos maiores reservas do São Paulo nas mais de duas décadas em que Rogério Ceni foi titular, cabe bem a Roger Noronha. O goleiro foi contratado em 1997 por empréstimo de seis meses junto ao Flamengo, que se tornaram nove anos com saídas para o Vitória e Portuguesa.

Mesmo assim Roger teve seus momentos no clube, com Ceni sendo o principal nome do gol são-paulino, foram 51 jogos como titular e cinco títulos, disputou três finais, e conquistou o Rio-São Paulo de 2001, na estreia de Kaká, e o Supercampeonato Paulista de 2002.

O momento preocupante na meta Tricolor

O goleiro Roger é, ao lado de Bosco, que chegou ao clube após sua saída, os expoentes de uma reserva de luxo do maior ídolo da história do São Paulo. Com a aposentadoria de Rogério Ceni em 2015, Renan Ribeiro, Denis, Sidão, Jean, Volpi, Lucas Perri, Jandrei e Felipe Luís não conseguiram nem de perto o respeito que Roger e Bosco tiveram.

Com a saída de Tiago Volpi, desgastado com a torcida por não emplacar e ainda falhar seguidamente, o São Paulo trouxe Jandrei que estava na reserva do Santos, e mesmo o camisa 93 não sendo uma unanimidade, trouxe preocupação do técnico Rogério Ceni com a lesão na região lombar.

Sem a confiança necessária em Tiago Couto revelado nas categorias de base, rapidamente o clube trouxe Felipe Alves, reserva do Juventude que luta para não cair para a Série B do Campeonato Brasileiro. Com a rotatividade na titularidade da meta são-paulina, e os recentes resultados ruins nas partidas da Copa do Brasil (derrota para o Flamengo por 3 x 0), e Copa Sul-Americana (derrota para o Atlético GO por 3 x 1), com falha de Jandrei, além de estar a 4 pontos da zona de rebaixamento, trouxeram novamente à tona a necessidade de um nome de peso para o gol.

E o futuro do gol do São Paulo?

Essa semana, especulações em torno de Marcelo Grohe, 35 anos, multicampeão pelo Grêmio, atualmente no Al-Ittihad da Arábia Saudita, surgiram no Morumbi.

Nesse bate-papo exclusivo com o Arquibancada Tricolor, além de muito mais sobre o momento atual do gol são-paulino, Roger também fala de sua passagem pelo clube, bom relacionamento e “DR” (discussão de relação), com Rogério Ceni, mesquinharia do M1TO, derrota por 7 x 2 para a Portuguesa no Pacaembu, e claro a polêmica revista G Magazine, em que ele posou nu no ano de 1999, situação que irritou o então técnico Paulo César Carpegiani, e culminou com seu empréstimo para o Vitória da Bahia.

Abaixo leia na íntegra a exclusiva de Roger ao Arquibancada Tricolor

AT: Você era jogador do Flamengo. O que te fez aceitar a proposta do São Paulo?

Roger: Eu sempre falo que na vida não existe coincidência, era para acontecer. Eu tive um atrito no Flamengo na época, e eu queria muito jogar. Fui campeão invicto em 96, eu achava que estava no melhor momento da minha carreira, o meu momento pelo Flamengo, e o Júnior que é comentarista hoje (TV Globo), preferiu colocar o Zé Carlos, na época meu reserva, e disse: olha o Zé Carlos está em final de carreira, jogou comigo e eu vou te colocar no banco, você tem muito tempo de Flamengo ainda, então vou colocar o Zé Carlos. Aí eu falei: então eu quero sair do Flamengo. E eu tive várias propostas de alguns outros clubes, do Inter de Porto Alegre, Inter de Limeira que eu iria chegar jogando, e o Flamengo, que na época era o Paulo Angione que era o diretor disse: faz o seguinte vou te emprestar para o São Paulo, seis meses e você esfria a cabeça, seu lugar é aqui no Flamengo, cria da base, e volta pra cá mais tranquilo. E a sorte minha, abrindo uns parênteses, que o São Paulo exigiu que fosse passe fixado, e chegou perto do final do meu empréstimo, falei: o Rogério não vai deixar eu jogar, e o Rogério na Copa dos Campeões em 97 foi operar o menisco, e estreia contra o Santos, o time do Santos tinha Edmundo, Viola, Marcelinho Carioca, Carlos Germano, Axel, um timaço, e logo no começo do jogo o Bordon foi expulso a gente com um a menos, e foi um dos melhores jogos da minha carreira, ganhamos de 1 x 0, o Vanderlei (Luxemburgo), era o treinador do Santos, ele entrou em campo e falou que “poucas vezes vi um goleiro pegar o que você pegou”. Aí eu cheguei no vestiário, era o Darío Pereyra o treinador e o Rojas treinador de goleiro, na mesma hora conversaram com a diretoria pedindo para me comprar, e com isso logo depois desse torneio eu fiquei no São Paulo. Então era pra ser mesmo.

Roger | Arquibancada Tricolor
Foto: ESPN

AT: Roger, 51 partidas como titular (26V, 13E, 12D), isso lembrando que tínhamos um Rogério Ceni, e você conquistou três vezes o Campeonato Paulista (1998, 2000 e 2005), o Rio-São Paulo de 2001 e a Libertadores de 2005. Bons números no São Paulo hein?

Roger: Uma coisa que eu friso bastante que muita gente pergunta: Ah porque você teve a oportunidade de sair do São Paulo, de ir para outros clubes, você ficou? Foram nove anos, eu cheguei em 97 e sai em 2005, então, muito tempo de São Paulo, porque desde quando eu cheguei eu tive meu espaço no elenco. Tanto que em 97 quando a gente foi para a final da Supercopa, eu lembro que o Rogério jogou o primeiro jogo que foi no Morumbi da final, e no jogo seguinte ele tinha sido convocado (seleção brasileira). Eu pensei, como é uma convocação para amistoso, acho que o São Paulo vai pedir a dispensa do Rogério para jogar no Monumental de Núñez, e o presidente chegou pra mim e falou: não Roger confio em você, quem vai jogar é você, Rogério vai para a seleção e você que vai jogar. Aí eu disse: Opa! Eles confiam, tenho meu espaço aqui. E uma coisa bem interessante, eu fui o único goleiro na reserva do Rogério a ganhar dois títulos, como titular do São Paulo, o Rio-São Paulo de 2001 e o Supercampeonato Paulista de 2002, e isso é muito legal.

AT: Isso que iria te perguntar, nesses nove anos de São Paulo, você jogou três finais e ganhou duas. Sendo reserva, foi um feito e tanto né?

Roger: Um jogo inclusive que vai ficar marcado na história do clube São Paulo, que foi a estreia do Kaká, que foi em 2001 o Rio-São Paulo, o surgimento do Kaká, ele entrou no jogo, fez dois gols, e eu participei do momento histórico da história do São Paulo que foi muito bacana.

AT: Você sempre diz que a sua relação com o Rogério Ceni sempre foi muito boa, e que teve apenas uma “DR” (discussão de relacionamento), com ele. Era uma parceria de companheirismo mesmo?

Roger: A gente dividiu muitos anos o quarto, a gente é da mesma idade mais ou menos, ele é um pouquinho mais novo, ele é 73 e eu 72, mas ele é um pouquinho mais acabado do que eu. Dividíamos o quarto, e quando a gente viajava até revista a gente falava: já comprou a Quatro Rodas? Então vou comprar essa aqui. A gente tinha os mesmos gostos, era muito bacana essa relação. Acabava o treino a gente ficava conversando, quando acabava o jogo que ele tomava algum gol, ele achava que poderia fazer diferente e ficava conversando, não existia trairagem, por isso eu acho que fiquei tanto tempo, a gente estava ali pensando no São Paulo, não pensando que tem que pegar a posição. A única “DR” que teve, um mal entendido danado, foi que a gente estava muito tempo sem ganhar do Corinthians, pra quebrar um tabu a gente foi jogar no Morumbi, ele estava com o tornozelo machucado, o Anderson zagueiro do Corinthians fez 1 x 0, falei: cara não vamos ganhar de novo. E fomos e o último gol, o Danilo chutou de fora da área, o Doni rebateu e o Fabio Simplício fez de cobertura encobrindo o Doni. E no último lance do jogo o Renato Abreu pegou uma rebatida de fora da área, foi a defesa mais bonita da minha carreira, aos 45 do segundo tempo, acabou o jogo. A torcida Independente fez uma enquete, quem está no melhor momento Roger ou Rogério e deu eu disparado que tinha que estar como titular do São Paulo. E foram entrevistar o Rogério, e ele falou: pô nunca vi ninguém ganhar a titularidade por causa de uma defesa. Aí a imprensa criou aquela polêmica. Ai eu falei: não foi por causa de uma defesa, quando entro em campo dou conta do recado, sempre faço minha parte e ajudo o time. Ai cheguei nele e falei: pô Rogério não foi por uma defesa. Ele disse: não foi isso que eu quis dizer, é que eles me perguntaram se eu vi a defesa do Roger, da forma específica da defesa. Então foi essa “DR”, mas nada de anormal.

AT: Ele era muito pão duro?

Roger: Pô cara! Por isso que ele está milionário. Eu peguei a dele desde do começo, no aeroporto ele ficava dando autógrafo, e eu vi que ele estava batendo papo, enrolando, e naquela loja de conveniência onde tinha revista em Congonhas, quando acabei de sair ele chega na loja: já comprou chocolate, então eu como o seu aí. Da outra vez vou fazer o contrário, chegar no aeroporto vou para o banheiro e vou ficar olhando só da porta, depois que ele sair da conveniência eu entro. Pô! Ele fica esperando eu comprar depois fica com esse “migué”. 

AT: Roger, aquela goleada por 7 x 2 para a Portuguesa, foi a pior derrota na sua passagem pelo São Paulo?

Roger: Com certeza, foi a primeira vez na minha carreira e graças a Deus a única. Foi um jogo muito atípico, nós perdemos dois jogadores, a gente estava com dois jogadores a menos, pediu pra que eu jogasse adiantado, você vai ser a nossa sobra, porque a gente vai tentar empatar, então o São Paulo não admitia mesmo com dois jogadores a menos, ficar recuado pra não tomar goleada. Isso acho que foi nosso erro capital, porque o time da Portuguesa era muito bom, certinho, e a gente quis jogar de igual pra igual com dois jogadores a menos. Mas eu sempre procuro tirar o lado bom das situações, foi muito criticado, os torcedores vaiaram, eu fui o único que a torcida não reclamou, não questionou. Quando eu entrei no ônibus para sair do Pacaembu, uma parte da torcida gritando meu nome, ali eu tive a certeza que a torcida confiava em mim, mesmo com essa situação, com essa derrota, os caras estão me apoiando, estão do meu lado, e isso pra mim serviu muito de saber que eu tinha realmente esse espaço no coração da torcida.

AT: Realmente a torcida gostava muito de você, até no episódio da revista, a torcida não pegou muito no teu pé, a maior confusão foi com Paulo César Carpegiani.

Roger:  Exatamente, e isso foi uma coisa muito pessoal, eu pedi para o São Paulo para ser emprestado para o Vitória da Bahia, porque eu não queria atrapalhar o final de ano do São Paulo. O Carpegiani já tinha falado comigo que em janeiro ele tinha um pré-contrato assinado com o Flamengo, tanto que ele foi pra lá em janeiro, e eu pedi a diretoria que me emprestasse para o Vitória até janeiro, para que eu não tirasse o foco do São Paulo. E foi exatamente o que aconteceu, o Carpegiani foi embora, depois em 2000 eu pedi para ser emprestado para a Portuguesa, disputei o Campeonato Brasileiro pela Portuguesa. E logo em 2001 na minha volta conquistamos o primeiro título do ano, então foi muito bacana que eu fiz questão de voltar para o São Paulo, para mostrar que o problema não era a torcida, o clube, e sim o Carpegiani. Voltei para o São Paulo em 2001 ganhando título, fiquei até 2005 e ganhei títulos importantes no São Paulo, principalmente a Libertadores de 2005.

AT: Roger, a grana era muito boa? Porque você posou na G Magazine, foi pelo dinheiro ou ego?

Roger: O que me fez posar foi a grana sem dúvida nenhuma, a gente fala: cavalo branco selado passa uma vez só. A gente não sabe do nosso futuro, tem que aproveitar qualquer oportunidade pra você fazer um pé de meia, a partir do momento que você não está prejudicando ninguém, cometendo nenhum crime, eu acho que você deve fazer. O que me fez não ter duvidas em relação a fazer o trabalho, foi que o Vampeta tinha feito antes, que o Dinei tinha feito, e foi encarado naturalmente, não teve nada com a torcida do Corinthians, bem exigente, e assim não teve nenhuma repercussão negativa, não teve nada que desmerecesse as carreiras do Dinei e do Vampeta por terem posado. Eu falei: se eles fizeram e foi tudo bem, eu também vou fazer e não vai ter problema nenhum. Então acho que esbarrou mesmo foi no Carpegiani.

Roger 3 | Arquibancada Tricolor
Roger estava no elenco campeão da Libertadores de 2005

AT: Desde a aposentadoria do Rogério Ceni o São Paulo não conseguiu acertar um goleiro, ninguém conseguiu ao menos ter uma temporada tranquila. Em sua opinião se deve isso?

Roger: Eu acho que duas coisas importantes. Primeiro para chegar em um clube como o São Paulo com essa cobrança toda, apesar que a base do São Paulo é muito forte, tem vários goleiros de qualidade, isso aconteceu comigo no Flamengo quando o Gilmar Rinaldi saiu, o Flamengo demorou a achar um goleiro também, passou Adriano, Paulo Cesar, Paulo Sergio, vários goleiros que não se firmaram. Então o São Paulo tinha que ter contratado em um primeiro momento, quando o Rogério parou um goleiro já com uma certa bagagem, com certa experiência pra poder não sentir tanta pressão de substituir o maior ídolo da história do São Paulo. Teve oportunidade lá atrás, que o Botafogo foi para a segunda divisão, o Jefferson quase fechou com o São Paulo, naquela época encaixaria como uma luva, ele vinha sendo convocado para seleção em algumas oportunidades, é um goleiro que chegaria com moral, bagagem, a torcida já conhecendo o seu talento, e ali era o momento ideal para o Jefferson ir. O São Paulo começou a contratar goleiros, sem história, sem currículo que eu dei o exemplo do Jefferson, isso é um fato. O outro é que quando o Volpi que era o goleiro da maioria, que foi contratado, destaque no México, uma certa moral, não tinha um reserva. Eu acho que um erro não só do São Paulo, mas também de alguns outros clubes, na minha época os times grandes de ponta tinham dois, três goleiros do mesmo nível, e isso você faz com que o outro goleiro se dedique, não dê brechas, para estar sempre jogando. Era meu caso no São Paulo, o Marcão com o Sérgio no Palmeiras, a maioria tinha dois goleiros do mesmo nível, que fazia com que o outro se dedicasse. Inclusive o Rogério quando parou ele falou exatamente isso, eu só fui o Rogério que eu fui, porque sempre tinha um goleiro na minha reserva que se eu desse brecha, iria pegar a posição, o Roger o Bosco. E hoje você vê poucos clubes com essa fartura de goleiros no mesmo nível.

AT: Essa semana saíram especulações de que empresários teriam oferecido o Marcelo Grohe de 35 anos, ex-Grêmio, que está na Arábia Saudita. Seria Grohe, o Fernando Prass do São Paulo? O Prass que cobriu a lacuna (não a história), do Marcos no Palmeiras após três anos.

Roger: Aí entra a história que eu te falei, um goleiro que já foi testado, campeão no Grêmio, vários títulos importantes, em que ele mostrou a qualidade, a frieza, de você jogar em um time desse porte, que o Grêmio naquela época era um time espetacular, de ponta, sempre brigando por títulos, ele já foi testado muitas vezes. Então acho que é um nome sensacional para o São Paulo.

AT: Roger, você acredita que Jandrei, Felipe Alves e Thiago Couto, algum deles com tempo de trabalho, poderia cobrir essa lacuna ou a pressão está muito grande?

Roger: Eu falo que goleiro é muito de time, de elenco. Como aconteceu até com o Hugo Souza no Flamengo, a gente fala que goleiro não basta ser bom, tem que ter sorte também. O Souza mudaria a chavinha dele naquele pênalti que ele defendeu do Atlético MG e foi bater o pênalti, se ele fizesse ali acabaria o jogo, ganharia o título, e a chavinha mudaria. Isso acontece muito, são goleiros bons, mas que precisariam dessa credibilidade de ganhar um título importante para poder se firmar e ter aquela paciência da torcida. Por isso que tem esse meio termo, até que o São Paulo feche a transação de um grande goleiro, o que mudaria essa chavinha, dar mais tranquilidade para o trabalho deles, seria ganhar um título importante, que é o que o São Paulo está pretendendo e correndo atrás bastante tempo.

Você pode ouvir a entrevista na íntegra aqui:

Ouça aqui o áudio da entrevista exclusiva de Roger para Wagner Vieira ao Arquibancada Tricolor

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