Ney Franco: “O Rogério é merecedor desta final pelo trabalho que desenvolveu no São Paulo este ano”

Foto: Rubens Chiri / São Paulo FC

Morumbi, 12 de dezembro de 2012, na noite daquela quarta-feira com 67.042 torcedores, o São Paulo conquistava a Copa Sul-Americana após jejum de quatro anos sem título. A tão falada final de um tempo só, contra o Tigre (ARG), que não retornou ao gramado para o segundo tempo, devido a uma grande confusão nos vestiários durante o intervalo, foi até ano passado, quando o clube ganhou o Campeonato Paulista, o símbolo de tempos difíceis do Tricolor, que ficou quase nove anos sem conquista. Para quem fez parte dessa história, como o então técnico Ney Franco, as memórias ainda estão muito presentes.

“Na realidade, esse dia foi muito intenso, vivemos a expectativa o dia inteiro para a final a noite, muito na lembrança a saída nossa da Barra Funda do CT para ir para o estádio, com o torcedor desde a saída da concentração, até o estádio, a gente recebendo o carinho do torcedor. E ficou muito marcado pra mim quando a gente entrou em campo, como treinador ver aquele estádio bonito, ali me deu praticamente uma certeza que aquele título não escaparia da gente”.

Hoje, 3.609 dias depois, prestes a completar 10 anos, o Tricolor volta a disputar o título da Copa Sul-Americana. Em um novo modelo, com final única, no Estádio Mario Alberto Kempes, em Córdoba, na Argentina, a 2.382 quilômetros do Morumbi, o São Paulo, equipe brasileira com mais títulos internacionais no currículo (12 no total), briga para voltar a figurar forte no cenário do futebol internacional, contra o Independiente del Valle, do Equador. Para Ney Franco não tem favorito, mas acredita no título para o Tricolor.

“Acho que vai ser um jogo difícil, um jogo único que tem essa particularidade, e você não pode errar. Em um campo neutro, mas me parece que o estádio vai ter a presença maciça do torcedor tricolor. Então eu acho que vai ter um ambiente muito bom, para que o São Paulo possa jogar, esse ambiente aliado a qualidade da equipe, muito forte, em condições de conseguir esse bicampeonato para o São Paulo”.

A campanha do São Paulo em 2012 foi invejável, título invicto com cinco vitórias e cinco empates em dez jogos, 15 gols marcados e apenas dois sofridos. Apesar disso, as oitavas de final da competição ficaram marcadas por azedar a relação entre Ney Franco e Rogério Ceni.

Após empatar em 1 x 1 fora de casa contra a LDU, no Morumbi, o empate sem gols dava a classificação do Tricolor para as quartas, mas com o forte jogo aéreo do adversário o então goleiro pediu uma substituição, quando percebeu que a escolha era William José e não o volante Cícero como queria, o capitão ficou indignado, o técnico por sua vez também não gostou da atitude e deixou isso bem claro. No ano seguinte, com a fraca campanha na Libertadores, Ney Franco deixou o clube, em entrevista ao “O Globo” disse que Rogério Ceni boicotava Paulo Henrique Ganso, na época Ceni respondeu que se tivesse tanto poder, Ney Franco teria caído antes. Hoje, após quase 10 anos, o treinador elogia o trabalho do desafeto, e diz que o que passou ficou no passado.

“Ele é merecedor dessa final, pelo trabalho que ele desenvolveu no São Paulo nesse ano, chegou bem na Copa do Brasil, e acho que tem tudo com o seu trabalho, e com a qualidade do seu elenco também, de dar ao torcedor do São Paulo esse bicampeonato que com certeza vai comemorar muito”.

Leia na íntegra a entrevista exclusiva de Ney Franco ao Arquibancada Tricolor:

AT: Ney Franco, você ganhou o título da Copa Sul-Americana em 2012, e agora o São Paulo luta pelo bicampeonato. E a sua conquista veio quatro anos após a era vitoriosa do clube de 2005 a 2008. Tinha muita pressão em cima disso?
Ney Franco: Sem dúvida, eu cheguei no São Paulo em 2012, no segundo semestre para disputar o segundo turno do Campeonato Brasileiro, e paralelamente nós começamos a disputar a Copa Sul-Americana, e eu me lembro muito bem que o São Paulo pela sequência de títulos que tinha há quatro anos anteriormente, com títulos nacionais e internacionais, existia uma cobrança muito grande em cima de todo profissional que estava no São Paulo né. E acho que a Copa Sul-Americana teve um determinado momento dela que percebemos que poderíamos dar isso ao torcedor, e conseguimos fazer uma competição muito sólida, uma equipe que praticamente não tomava gol, e com alguns jogadores que desequilibravam no ataque. Ficamos felizes por essa quebra de jejum, e logicamente a felicidade maior de ver o torcedor do São Paulo comemorar um título no Morumbi lotado, onde foi uma noite muito mágica, completa agora 10 anos, mas a memória está muito acesa porque realmente foi marcante na vida de todos aqueles profissionais que estavam trabalhando no São Paulo naquela época.

AT: Você falou da campanha, foram 10 jogos, 5 vitórias, 5 empates, marcou 15 gols e só sofreu 2. Uma campanha invicta de ficar para a história.
Ney Franco: Nossa equipe ela encontrou um encaixe, costumo falar que os números do São Paulo no segundo semestre de 2012, disputando o Campeonato Brasileiro e a Copa Sul-Americana, são números interessantes. Se dermos um recorte dos 10 últimos anos do São Paulo e pegar só esse segundo semestre realmente foi uma campanha muito boa. E isso se deve por ter um sistema defensivo muito sólido, me lembro que na época eu adaptei o Paulo Miranda que era um zagueiro de lateral direito, dando liberdade para o Cortez na lateral esquerda de apoiar mais, tínhamos o Rafael Tolói e o Rodholfo em um momento bom, a segurança do Rogério que além de goleiro era um líder dentro de campo, dois volantes em um momento muito bom o Wellington e o Denílson, e ainda ter o jovem Casemiro que entrava em muitos jogos, o Maicon, o Jadson em um momento especial e um ataque que funcionou muito, com Lucas aberto pelo lado direito, Osvaldo do lado esquerdo, e o Luís Fabiano como atacante centralizado, tendo ainda o William José no banco como uma possibilidade de situação nas competições, e ele foi determinante, nos momentos em que o Luís Fabiano que ficou lesionado, de fora de jogos por problemas disciplinares de cartão, e o William entrou e respondeu muito bem. Então foi um momento muito bom. Além do título a possibilidade de no ano seguinte uma Libertadores, o São Paulo há muito tempo não disputava a Libertadores, a gente sabe que é a grande paixão dos torcedores, dos clubes grandes, entre eles o São Paulo, então a gente foi muito feliz no segundo semestre de 2012.

AT: Claro que se fala muito daquela confusão, jogo de um tempo só. Mas como ficou a tua cabeça naquele momento, sabendo teoricamente que ainda teria o segundo tempo, em meio aquele episódio, até que veio a confirmação do título?
Ney Franco: Na realidade, esse dia foi muito intenso, vivemos a expectativa o dia inteiro para a final a noite, muito na lembrança a saída nossa da Barra Funda do CT para ir para o estádio, com o torcedor desde a saída da concentração, até o estádio, a gente recebendo o carinho do torcedor. A chegada no Morumbi também, na praça, nos grandes jogos do São Paulo, a torcida recebe a sua equipe ali na praça. E ficou muito marcado pra mim quando a gente entrou em campo, como treinador ver aquele estádio bonito, ali me deu praticamente uma certeza que aquele título não escaparia da gente. Fizemos um primeiro tempo muito sólido, mais uma vez mantendo com a equipe no primeiro tempo sem tomar gol dentro de casa, mas dentro de um jogo muito catimbado, mas a gente teve a felicidade e a competência de fazer dois gols no primeiro tempo, e fica esse gostinho de que poderia ser um pouquinho mais, infelizmente não teve o segundo tempo, por questões disciplinares da equipe adversária, mas que não tira nosso merecimento, e a festa que a gente fez quando foi decretado. Então na realidade fica muito na lembrança também, quando a gente retorna para o segundo tempo, e que ficamos um tempo em campo esperando, o adversário não compareceu, não retornaram para o jogo, e foi um momento em que toda a diretoria da Conmebol estava no Morumbi, e foi legal ver eles descerem, montou-se o palco, a gente recebeu a medalha, o troféu, e fizemos uma festa enorme com o nosso torcedor, que foi premiado com esse título que ficou marcado para uma geração inteira.

AT: Você já ganhou Copa do Brasil, título mundial com a seleção brasileira Sub20, entre tantas outras conquistas importantes. Essa Copa Sul-Americana foi a mais importante?
Ney Franco: Tudo é momento! Eu não posso esquecer nunca de um título da Copa do Brasil com o Flamengo no Maracanã lotado contra o Vasco da Gama, isso marca muito. Não posso esquecer do meu título mineiro com o Ipatinga em pleno Mineirão a gente ganhar do Cruzeiro em pleno Mineirão, 70 mil torcedores do Cruzeiro, o Ipatinga conseguir esse título. Não posso esquecer do título com o Coritiba da Série B do Campeonato Brasileiro de 2010, onde o Coritiba além de um acesso, a gente conseguiu um título. E dois títulos importantíssimos com a seleção brasileira, um Sul-Americano e um mundial em cima de Portugal, e ali eu tive a oportunidade de dirigir grandes jogadores, que hoje jogam no cenário internacional como Neymar, o próprio Lucas, Casemiro, Philipe Coutinho, Dudu que hoje está no Palmeiras, Danilo, Alecsandro. Então acho que cada título representou muito pra mim, mas sem dúvida esse título internacional com o São Paulo ele é um título que representa muito, e todos esses títulos ficam muito na memória, porque a gente estava ali com a responsabilidade enorme de treinador e quando você termina a competição como campeão, logicamente que são lembranças fortes, que elas não se apagam da memória. Aquela chegada no Morumbi, aquela recepção da torcida, e a festa que a gente fez depois, coroou todo um trabalho de uma equipe, que teve números expressivos, e também jogou muito bem. Me lembro bem dos nossos dois confrontos com a Universidad do Chile, que tinha sido campeão da Sul-Americana, no ano seguinte, inclusive dirigido pelo Jorge Sampaoli, que a gente ganhou no Chile pro 2 x 0, depois no Pacaembu ganhamos de 5 x 0, e praticamente naquele jogo eu percebi que a gente estava com a equipe madura em condição do título. Então foram vários momentos nessa campanha do São Paulo, está cravada na memória, e é muito importante ter no currículo essa conquista.

AT: Você teve aquele problema com o Rogério Ceni em que reclamou que na época ele queria mandar no São Paulo, e ele não gostou muito, mas em outras entrevistas você disse que isso já passou. De qualquer maneira, você foi o técnico na conquista do último título dele como profissional. É marcante isso?
Ney Franco: Sem dúvida, e o Rogério a partir disso jogou algum tempo, e depois começou uma carreira muito vitoriosa como treinador. Ele é merecedor dessa final, pelo trabalho que ele desenvolveu no São Paulo nesse ano, chegou bem na Copa do Brasil, e acho que tem tudo com o seu trabalho, e com a qualidade do seu elenco também, de dar ao torcedor do São Paulo esse bicampeonato que com certeza vai comemorar muito.

AT: Como treinador você chegou a enfrenta-lo?
Ney Franco: Já enfrentei o Rogério, em 2018 eu peguei o Goiás na série B, o Goiás em uma situação muito ruim, e a gente teve uma recuperação no Campeonato Brasileiro, e foi justamente o ano que o Rogério estava no Fortaleza e que subiu para a série A, e eu estava no Goiás, e conseguimos o acesso com o Goiás. Me lembro que nós tivemos dois embates, o primeiro jogo em Fortaleza, e o Fortaleza ganhou de 3 x 1, depois o jogo em Goiás, nós devolvemos esse placar no segundo turno, depois já nos encontramos em cursos da CBF. O Rogério se preparou muito, aliando essa preparação com a experiência que ele tem dentro de campo, e está se firmando no cenário brasileiro, como um dos grandes treinadores.

AT: Você acredita em título do São Paulo?
Ney Franco: Acredito, embora eu acho que não tem favoritismo, acho que vai ser um jogo difícil, um jogo único que tem essa particularidade, e você não pode errar. Em um campo neutro, mas que me parece pelas informações que a gente está colhendo, vendo o noticiário, me parece que o estádio vai ter a presença maciça do torcedor tricolor. Então eu acho que vai ter um ambiente muito bom, para que o São Paulo possa jogar, esse ambiente aliado a qualidade da equipe, muito forte, em condições de conseguir esse bicampeonato para o São Paulo.

Receba notícias do SPFC no WhatsApp e Telegram.
Siga-nos no Instagram, no YouTube e no Twitter.

Compartilhe esta notícia